A Invasão Holandesa de Salvador em 1624
Contexto Histórico
No final do século XVI e início do XVII, o Brasil, ainda sob o domínio da coroa portuguesa, tornou-se alvo de interesses estrangeiros devido à sua importância estratégica e econômica.
A Baía de Todos os Santos, em particular, emergia como um ponto vital nas rotas comerciais, atraindo a atenção de potências como a Holanda, que se encontrava em guerra com a Espanha durante a União Ibérica (1580-1640).
Nesse contexto, os holandeses, desejando assegurar seu controle sobre o lucrativo comércio de açúcar, iniciaram uma série de tentativas de invasão à capital do Brasil, Salvador.
Vídeo sobre a invasão holandesa de Salvador em 1624
A Invasão Holandesa de Salvador em 1624
A primeira dessas incursões ocorreu em 1599, sob o comando de almirantes como van Leynssen, seguido por novas tentativas em 1604 e, posteriormente, uma invasão em larga escala em 1624.
Essas tentativas, ainda que inicialmente fracassadas, demonstravam a crescente ambição holandesa sobre as posses ibéricas no Novo Mundo e a tensão crescente no Atlântico.
História da Invasão Holandesa de Salvador em 1624
A primeira tentativa de invasão holandesa de Salvador ocorreu em dezembro de 1599, quando o almirante van Leynssen enviou sete navios ao Brasil, comandados pelos capitães Hartman e Broer.
No início do século XVII, Salvador era uma das mais importantes cidades da América, a capital do Brasil, um estado português controlado por espanhóis durante a União Ibérica (1580-1640). Os ataques na Baía de Todos os Santos duraram quase dois meses. Os holandeses afundaram várias embarcações portuguesas e pilharam engenhos no Recôncavo, mas fracassaram no objetivo de conquistar a cidade.
Nos anos seguintes, os piratas holandeses continuaram atacando navios espanhóis e portugueses em alto mar, tanto no Atlântico quanto no Oceano Índico. Em 1604, tentaram novamente conquistar Salvador, dessa vez com uma esquadra de seis navios comandada por Paulus van Caerden. O ataque foi similar ao primeiro e o resultado foi o mesmo fracasso.
A Grande Invasão de 1624
Em 1621, os holandeses fundaram a Companhia das Índias Ocidentais (West-Indische Compagnie), uma empresa patrocinada pelo governo holandês, com a participação de investidores privados, que buscava principalmente a exploração comercial da América.
A cidade amanheceu sob o domínio e os efeitos do bombardeio de uma esquadra holandesa composta por 26 navios, sob o comando de Jacob Willekens. A invasão holandesa de Salvador ocorreu em 9 de maio de 1624. Na véspera, mesmo sob fogo cruzado do Forte de Santo Antônio, os holandeses conseguiram alvejar os canhões da Ponta do Padrão e desembarcaram no Porto da Barra.
Grupamentos de vanguarda seguiram pela Ladeira da Barra e despenhadeiros até alcançarem a Porta de São Bento. Os holandeses passaram a madrugada no mosteiro “ao sabor de vinhos e confeitos” que encontraram no local, aguardando o dia amanhecer para tomar o centro da cidade.
Conforme Ricardo Behrens, no livro ‘Salvador e a invasão holandesa de 1624-1625’, “relatos portugueses e holandeses contam que o confronto teve início no dia anterior quando os da cidade receberam com disparos um batel com bandeira de paz enviado pela frota, antes mesmo de ouvirem a embaixada”.
Em resposta, os invasores descarregaram seus canhões no costado da cidade, nos fortes e nos navios que estavam no porto.
A visão da armada, por si só, provocou pânico e correria na maioria dos habitantes. Por mais que soubessem da probabilidade dos ataques, a cidade não dispunha de nenhuma estratégia especial. D’El Rey não estabelecera nenhum recurso para armamentos.
Já os holandeses, cuja armada partiu do porto de Texel em dezembro e cuja viagem durou, portanto, quase seis meses, estavam imbuídos do propósito de invadir a capital do Reino do Brasil e contavam com bastante munição.
Os arrasadores disparos de canhões durante a invasão holandesa e o vandalismo dos invasores acarretaram inúmeros prejuízos à cidade, inclusive ao prédio da Câmara, onde estava instalado o Arquivo Histórico, cujos documentos foram completamente destruídos pelo fogo.
De acordo com o historiador Affonso Rui, no livro ‘História política e administrativa da cidade de Salvador’, “os oficiais encarregados da documentação, como boa parte da população, fogem para Abrantes”.
Os 3.400 homens, entre aventureiros e mercenários que compunham a esquadra invasora holandesa, não encontraram maiores resistências para render o governador-geral da colônia, D. Diogo Mendonça Furtado, e aprisioná-lo na chamada Casa dos Governadores (no que viria a ser o Palácio Rio Branco, na atual Praça Tomé de Souza), em pleno coração da urbe, uma das mais importantes cidades da América, então capital do Brasil.
O governante português já havia se mostrado preocupado com o despreparo bélico do Brasil e chegou a entrar em choque com a Igreja, que não via necessidade de preocupações militares. Assim, os holandeses não tiveram muitos problemas para tomar a cidade, e Diogo Mendonça Furtado assinou sua rendição um dia depois.
Ele foi levado prisioneiro para Amsterdã, com outras 12 pessoas, entre auxiliares e jesuítas, de onde somente foram libertados em 1626.
A Resistência e a Retomada
A permanência dos holandeses em terras baianas duraria praticamente um ano. Cabe ao bispo Dom Marcos Teixeira, posteriormente denominado Bispo Guerreiro, promover a resistência. Através da tática de emboscadas, impede os invasores de sair da cidade. Em 27 de março de 1625, a esquadra de reforço portuguesa-espanhola, comandada pelo espanhol D. Fradique de Toledo Osório, chega a terras baianas.
Foram mais de 40 dias de batalha e, em 1º de maio, obtém a primeira rendição.
O Contexto Internacional e a Expulsão dos Holandeses
Fevereiro de 1630. Navios e canhões holandeses entram novamente em águas brasileiras. Dessa vez, invadem Pernambuco, maior produtor mundial de açúcar na época. Desembarcam no litoral pernambucano e conquistam Olinda e Recife com relativa facilidade.
O então governador Matias de Albuquerque retira-se para o interior com homens e armas e funda o Arraial do Bom Jesus, uma fortificação de onde partiam os ataques aos invasores. Como na invasão da Bahia, os lusos-brasileiros adotam a guerra de emboscadas na tentativa de impedir os holandeses de penetrar nas terras onde estava a maioria dos engenhos.
A resistência, no entanto, não contém o avanço holandês, que chega a receber apoio de moradores da região, como é o caso de Antônio Fernandes Calabar. A colaboração, muito mais que traição, visava livrar-se do domínio português. Derrotado, Matias Albuquerque manda incendiar os canaviais à sua volta e retira-se para Alagoas. Antes, porém, consegue prender Calabar e manda executá-lo.
Sete anos depois, em 1637, a Companhia das Índias Ocidentais decide reconstruir os engenhos com o objetivo de voltar a obter lucro com o açúcar brasileiro. Para liderar esse projeto, envia ao Brasil o conde João Maurício de Nassau-Siegen, com o título de governador-geral.
A acumulação de riquezas da Companhia das Índias Ocidentais reflete-se na administração e na reconstrução de Recife, a capital do Brasil holandês. Maurício de Nassau teve a habilidade de convidar alguns senhores de engenho para participar da administração, mantendo uma tolerância religiosa e não obrigando os colonos luso-brasileiros a converterem-se ao protestantismo dos holandeses.
Em 1640, Portugal consegue independência da Espanha. Em agosto de 1645, os colonos luso-brasileiros conseguem importante vitória no Monte das Tabocas. O governo da Bahia envia auxílio e Recife é sitiada. A vitória, todavia, não conseguiu desalojar os holandeses, muito bem guarnecidos por mar. As lutas prosseguem por três anos.
No final de 1648, os holandeses sofrem grande derrota na Batalha dos Guararapes. Ainda assim, Recife continua em poder da Companhia das Índias Ocidentais. A situação internacional, contudo, ajuda a acabar com o impasse no conflito entre holandeses e colonos no Brasil. A Inglaterra declara guerra à Holanda, na disputa pela hegemonia dos mares, e os ingleses chegam a auxiliar os rebeldes anti-holandeses no Brasil.
Os governantes portugueses aproveitam o enfraquecimento dos invasores e enviam um grande reforço para os colonos no Brasil, em fins de 1653. Finalmente, em janeiro de 1654, os holandeses se rendem, encerrando o período de domínio holandês no Brasil. Contudo, somente em 1661, o governo holandês reconhece que não tinha mais direitos sobre o Brasil.
Conclusão
A invasão holandesa de Salvador em 1624 e os eventos subsequentes marcaram um período significativo na história do Brasil, refletindo as complexidades das relações internacionais e as tensões entre potências coloniais. O legado dessa invasão ainda é sentido na memória histórica e cultural do Brasil contemporâneo.
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